Cuidar de uma criança autista é como aprender um novo idioma, feito de gestos, silêncios, olhares e reações que vão além das palavras. A regulação emocional, ou seja, a capacidade de lidar com sentimentos intensos e retornar ao equilíbrio após um estímulo difícil, é um dos maiores desafios enfrentados por crianças autistas.
Este artigo explica por que esse processo é mais complexo no autismo, como reconhecer os sinais de desregulação, a importância de ambientes estruturados e como pais, cuidadores e educadores podem apoiar verdadeiramente.
Ajudar uma criança autista não significa controlar ou corrigir os comportamentos, mas caminhar ao lado dela, oferecendo apoio contínuo e respeitoso.
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O que é regulação emocional e por que ela é desafiadora no autismo?
Antes de ajudar, é essencial entender o que é regulação emocional. Trata-se da habilidade de reconhecer, compreender e gerenciar emoções como frustração, medo, tristeza ou raiva, e retornar ao equilíbrio. Para a maioria das pessoas, esse processo é automático. Porém, para crianças autistas, ele pode apresentar desafios significativos.
Esses desafios têm raízes em fatores neurobiológicos. Crianças autistas geralmente enfrentam hipersensibilidade sensorial, como desconforto com sons altos, luzes intensas ou toques específicos. Além disso, há dificuldades na comunicação, tanto verbal quanto não verbal, e na leitura de sinais sociais.
A ansiedade elevada também é comum e intensifica as reações emocionais. Isso torna o mundo mais imprevisível e desconfortável, o que dificulta a regulação emocional.
Uma situação simples para uma criança neurotípica pode ser excessivamente estressante para uma criança autista. O que pode parecer uma “birra” é, na verdade, uma resposta legítima a algo que ela ainda não sabe processar. Portanto, ajudar não significa forçar a criança a se acalmar, mas fornecer ferramentas para que ela entenda suas emoções em um ambiente seguro e acolhedor.
Como identificar sinais de desregulação emocional em crianças autistas
Identificar quando uma criança está emocionalmente desregulada é crucial. Os sinais de desregulação podem se manifestar de várias formas: choro intenso, gritos, tentativas de fuga, comportamentos agressivos, autoagressão,, isolamento, aumento das estereotipias (movimentos repetitivos como balançar o corpo ou bater as mãos) e dificuldade com mudanças na rotina.
Cada criança manifesta a desregulação de maneira única. Algumas se tornam agitadas e explosivas, enquanto outras se fecham completamente. O importante é observar com empatia e entender o comportamento. Em vez de perguntar “o que essa criança tem?”, o mais produtivo seria refletir: “o que ela está tentando me comunicar com esse comportamento?”.
O ambiente também desempenha um papel fundamental. Muitos lugares, como escolas e supermercados, podem sobrecarregar a criança com estímulos sensoriais, como sons altos, luzes fortes e cheiros intensos. Isso pode desencadear crises de desregulação. Ajustes simples no ambiente, como o uso de fones de ouvido, cantinhos tranquilos com iluminação suave ou brinquedos sensoriais, podem ajudar significativamente a criança a se sentir mais confortável.
Estratégias práticas para apoiar a criança em momentos difíceis
Nos momentos de desregulação, a criança precisa de acolhimento e segurança. O adulto deve ser um ponto de referência seguro, transmitindo calma e empatia. Algumas estratégias eficazes incluem:
- Nomear emoções: muitas crianças autistas têm dificuldades para identificar o que sentem. Usar recursos visuais, como cartazes com expressões faciais ou desenhos, pode ajudar a criança a entender e nomear suas emoções. Associações visuais tornam esse processo mais acessível.
- Oferecer ferramentas de autorregulação: técnicas como respiração guiada, pausas planejadas e brinquedos sensoriais são úteis para ajudar a criança a se reorganizar emocionalmente. Elas devem ser usadas de maneira constante, não apenas em momentos de crise.
- Validar emoções: reconhecer os sentimentos da criança é essencial. Frases como “Eu vejo que você está chateado” ou “Esse som é realmente muito forte, né?” ajudam a criança a se sentir compreendida. Validar as emoções não significa aprovar comportamentos inadequados, mas reconhecer o sentimento que está por trás deles.
Essas estratégias não exigem formação profissional, mas sim empatia e a capacidade de ouvir ativamente. O apoio constante fortalece a capacidade da criança de lidar com suas emoções de forma autônoma ao longo do tempo.
O papel da família e da escola no desenvolvimento da autorregulação
A autorregulação emocional é aprendida ao longo do tempo, especialmente através das relações com adultos. Para crianças autistas, esse processo demanda mais paciência, tempo e consistência. Os adultos de referência, como pais, professores e terapeutas, desempenham um papel essencial ao praticarem a co-regulação, isto é, permanecendo calmos e disponíveis nos momentos de maior intensidade emocional.
Família, escola e profissionais devem trabalhar juntos, com comunicação constante e ações coerentes. Quando os adultos respondem de maneira consistente às dificuldades da criança, ela se sente mais segura e confiante. A consistência não é sinônimo de rigidez, mas sim de adaptação contínua das estratégias de apoio.
Celebrar os pequenos progressos é fundamental. Isso inclui momentos como quando a criança consegue se acalmar sozinha, identificar uma emoção ou procurar o cantinho da calma. Cada vitória deve ser reconhecida, pois todas contribuem para o desenvolvimento da autorregulação.
O apoio acontece através de um olhar que acolhe
Apoiar a regulação emocional de uma criança autista não significa tentar “consertar” os comportamentos, mas construir uma ponte entre o que a criança sente e o que ela ainda não consegue expressar. Isso exige tempo, paciência e um olhar atento e respeitoso.
Mais do que técnicas específicas, o que realmente faz diferença é a presença constante e empática do adulto.
A autorregulação começa com a co-regulação. Quando os adultos estão ao lado da criança, oferecendo segurança e acolhimento, a criança aprende a lidar melhor com suas emoções.
Iniciativas como o Edu Autista mostram como uma abordagem empática e acessível pode transformar a forma como vemos o autismo.
Com apoio verdadeiro, nenhuma criança precisa caminhar sozinha em sua caminhada emocional.